Após três anos afastado do Carnaval SP, o Carnavalesco Jorge Silveira comemora seu retorno à Escola de Samba Dragões da Real com muito entusiasmo e a promessa de levar a Agremiação ao seu primeiro título pelo Grupo Especial.
Capa: Nelson Gariba/Sintonia de Bambas
Colecionando passagens importantes pelas Escolas de Samba do Rio e outras regiões do País, a carreira de Jorge Silveira é marcada por desafios e muitas conquistas. Em sua primeira parada na Dragões da Real desenvolveu importantes temas, juntamente com um time de peso de Carnavalescos da Escola, sendo o ano de 2017 um dos mais importantes e com um trabalho bastante elogiado na mídia e público. O Enredo “Dragões canta Asa Branca”resultou no vice-campeonato da Agremiação.
Em meio de uma pandemia que mudou a vida de todos e que acarretou em perda de entes queridos, a superação e a alegria da Comunidade da Dragões da Real fez surgir um novo Enredo “O Dia em que a Terra Parou” e com a assinatura de Jorge ganha mais colorido e vibração nos carros e alegorias da Agremiação.
Em entrevista ao Sintonia de Bambas, o Carnavalesco Jorge Silveira conta como está feliz com seu retorno à Dragões de Real, agora como figura de Carnavalesco principal. Segundo ele, a experiência com a escassez de recursos que teve em outras Agremiações gerou um grande aprendizado e amadurecimento para lidar com um Enredo que fala sobre a humanidade em um momento tão delicado e de reflexão.
Sintonia: A Dragões tem como característica Enredos com uma temática mais subjetiva com foco nas emoções humanas e traz nos Desfiles uma enorme gama de subtemas e homenagens. A riqueza do colorido e de beleza dos carros e alas faz o público se emocionar e criar uma conexão com a Escola. Em tempos que a valorização do contato e do afeto ocuparam um lugar ainda mais delicado, como trabalhar essa característica sem cair em um discurso demasiadamente romantizado?
Jorge: A Dragões vêm construindo uma trajetória ao longo dos anos muito sólida. Fundamentada em Enredos que têm uma forte preocupação em se traduzir de maneira clara para o público na Avenida. Eu participei junto com meus amigos desse processo de transformação da estética da Escola a partir da sua visualidade. No meu retorno darei ainda mais ênfase na leitura clara da minha proposta de Carnaval, isso é um traço natural do meu trabalho. Faço questão de me comunicar com o público através dos símbolos e ícones no Desfile, não significa em absoluto obviedade, muito menos romantismo sobre o nosso momento atual, mas um Desfile de Escola de Samba como canal poderoso de comunicação e transmissão de mensagens. Sou muito consciente dessa responsabilidade. Sei do poder de fogo que tenho nas mãos e usarei com sabedoria para que nossa comunidade dê de maneira potente seu recado.
Sintonia: Pensando no título do Enredo e fora do contexto da pandemia, você abordará movimentos democráticos que de certa forma fizeram o País parar?
Jorge: A proposta do nosso Enredo nasceu da proposição desse tema pelo nosso Diretor de Carnaval, o amigo Márcio Santana, que perdeu a mãe para a Covid 19. Mas ao invés de sucumbir a dor da perda, ele refletiu profundamente sobre como usar essa força para somar de maneira positiva. Quais lições podemos aprender diante das grandes dificuldades da vida? Partindo dessa reflexão criei o conceito do Desfile e desenvolvi a linha narrativa. O caminho que escolhi dá conta dessa reflexão. O Presidente Tomate (Renato Remondini) me orientou a criar um Carnaval que leve uma mensagem de perseverança e crescimento diante das barreiras impostas pela vida, assim vamos focar em um Carnaval com essas lições e aprendizados. A mensagem básica é um convite a uma profunda reflexão: De que forma podemos aprender com as adversidades e direcionarmos essa energia para transformar nossa realidade?
Sintonia: Com a internet olhamos para o mundo com uma velocidade incrível, e de certa forma, a pandemia tirou a venda sobre a superficialidade que tratamos as medidas de prevenção, políticas públicas e cuidados com os mais vulneráveis e a consequência disso, como o aumento da fome e da miséria. Além das ações sociais da Escola, como você acredita que o Carnaval e a Dragões pode colaborar quanto à melhoria da qualidade de vida dos cidadãos que compõem as comunidades?
Jorge: Tudo já mudou. Toda essa nova realidade nos forçou a rever todos os nossos valores e procedimentos. “O mundo parou” e sacudiu nossas estruturas. O gancho do Enredo criou uma onda de consciência e participação solidária que motivou e envolveu toda a Comunidade. Os sentimentos de coletividade, participação, pertencimento e, fundamentalmente, solidariedade vieram para ficar. Desde o nosso Carnaval de 2017 (Dragões canta Asa Branca), a Escola passou a viver cada Enredo como uma experiência intensa durante o ano inteiro. Portanto, a cada nova jornada o Enredo proposto soma novas virtudes e qualidade, sejam técnicas ou emocionais, a nossa gente querida. O Enredo de 2021 motivou um conjunto de ações e práticas que chegaram para fortalecer ainda mais o papel social da Dragões junto com a sua Comunidade. Neste momento de afastamento social, a Agremiação vêm dando uma verdadeira aula de acolhimento de sua comunidade. Mesmo distantes fisicamente, os componentes se tornaram ainda mais unidos com a Escola.
Sintonia: Em uma declaração do Diretor Márcio Santana, a Dragões mantinha sete funcionários trabalhando nas fantasias e alegorias no barracão. Isso ainda acontece ou com a flexibilização das atividades, esse número de funcionários aumentou?
Jorge: A Diretoria da Escola conseguiu criar uma rede de trabalho para esses funcionários logo que a pandemia começou. Através desse ato conseguimos que as famílias pudessem ter seu sustento, mesmo diante do período complicado. Com isso pudemos fazer nossos pilotos de fantasia por completo e demos início a construção do carro Abre-Alas. Agora, estamos numa fase de aguardar novas determinações sobre o financiamento do Carnaval junto a Prefeitura de São Paulo para darmos continuidade ao nosso planejamento.
Sintonia: Como o Carnavalesco precisa adaptar seu trabalho diante desse cenário de Pandemia. Isso pode impactar nos carros alegóricos e alas quanto a sua idealização e materialização, e principalmente, na mensagem do Enredo?
Jorge: Eu também estou tendo que me adaptar como cada ser humano nesse momento. A dificuldade que eu estou enfrentando é a mesma que meus colegas nas outras Agremiações também estão. O cenário é completamente novo e ainda restam incertezas sobre muitos aspectos. Quanto a narrativa do Enredo, estou amplamente acostumado a lidar com graus severos de limitação e dificuldade. Devo lembrar que acabo de retornar de três Carnavais no Grupo Especial do Rio e em uma Escola que não tinha patrono nem patrocínio, a São Clemente está a longe de operar com os maiores orçamentos do Carnaval, e mesmo assim eu criava as soluções. Foram três anos que também enfrentei, como todos os profissionais, o corte de verba da Prefeitura do Rio para as Escolas. Em 2020, o investimento público foi zero. Portanto, no quesito “adversidade” eu estou escaldado em verso e prosa (risos). A gente cresce diante dos desafios.
Sintonia: Como resumir o Enredo “O Dia em que a Terra Parou”?
Jorge: “O Dia em que a Terra parou” em última análise é uma grande mensagem de solidariedade. Diante das dificuldades da vida é que somos testados. É nessas circunstâncias que nossos reais valores são colocados a prova. A mensagem do nosso Carnaval é que se estendermos a mão ao nosso semelhante, criamos uma corrente. O mundo parou, e com essa pausa pudemos olhar para dentro e para quem está ao nosso lado. Nossa busca é mostrar que podemos aprender com as dificuldades e nos tornarmos pessoas melhores. Quando tudo isso passar, só depende de nós transformarmos nosso mundo num lugar de gente mais feliz.
A marcante característica de desenvolver os temas com traços cartunescos entrarão em ação no Anhembi e o público pode esperar ainda mais vibração da Dragões. Uma Escola que sempre levanta a Avenida e desponta como favorita ao título de campeã do Carnaval.
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