Em 2021, a Roseira completará 50 anos trazendo Paulo Menezes como seu novo Carnavalesco. Paulo falará sobre rituais aplicados ao cotidiano do homem em busca da cura.
Foto: Nelson Gariba
Com um olhar atento à liberdade poética que os temas de Enredo oferecem na construção de um Desfile de Carnaval, Paulo Menezes estreia como Carnavalesco da Escola de Samba Rosas de Ouro e busca se comunicar com o público para desvendar, como ele mesmo enfatiza, rituais de cura, que represente a essência e o propósito de transformação.
Sendo o Carnaval um palco do cotidiano onde se representa, vivencia e equaciona os mais variados aspectos socioculturais podemos esperar mais um bom Desfile da Rosas de Ouro no Anhembi em 2021.
A Escola através do Enredo “Sanitatem”, palavra derivada do latim que significa cura e bem estar, pretende contar a história sobre os rituais que proliferam nas mais variadas entidades sociais e nas matizes simbólicas ou místicas na busca do homem e da sociedade pela cura de seus males e problemas.
Presente no Carnaval pelo Brasil desde 1992, Paulo Menezes chega na Roseira e conversou com o Site Sintonia de Bambas sobre o desenvolvimento do tema. Confira:
Sintonia – Baseando-se na parceria de trabalhos incríveis com o Carnavalesco Paulo Barros e que resultou, também, na passagem marcante da dupla em 2020 pelo Carnaval SP, o que podemos esperar de Paulo Menezes à frente da Rosas de Ouro com um Enredo que conta a influência social das práticas de cura através da religião e da ciência, ainda mais num contexto de Pandemia em que estamos vivendo?
Carnavalesco – Primeiro vamos entender o Enredo, ele fala sobre os RITUAIS DE CURA, e não em práticas de cura, são conceitos diferentes. Ele não fala nunca em influências sociais. Falaremos de como o homem, a partir do momento que se reconhece como tal e como grupo e sociedade busca formas se curar dos males que afligem a si e a seu grupo. E com os rituais procura caminhos que o leve à cura desses males, esses caminhos podem ser através da religiosidade ou religião (que são coisas diferentes), da magia, do encantamento, da fé, da mente e da ciência. Um ritual abrange muito mais que uma prática, ele a engloba, mas vai muito além disso. O contexto da Pandemia foi fundamental para a criação do Enredo, pois ele influenciou diretamente o nascimento de “SANITATEM”. Talvez se não estivéssemos passando por esse momento, esse Enredo não tivesse nascido, pois vêm ao encontro de um desejo de que tudo isso passe, que possamos mais uma vez vencer um desafio e que ao final de tudo estejamos prontos para nos abraçar e comemorar mais uma vitória da humanidade. Podem esperar um Paulo Menezes feliz com a nova casa, até porque já namorava ela há algum tempo. Um Carnavalesco inspirado e voltando as suas origens de Carnavais mais detalhados e “barrocos”, mas vejo esse Carnaval mais Rococó do que Barroco.
Sintonia – Uma das características do Carnavalesco é construir uma narrativa que faça ponte entre passado, presente e futuro. Ao mencionarmos que a cura pode ser interpretada como um ato de eliminação de uma dor ou de um mal, poderemos ter um Desfile no Anhembi que irá desconstruir as falácias dos tratamentos milagrosos ou da distorção do que é a cura como, por exemplo, o termo “cura gay” que ganham tanta força nas mídias sociais?
Carnavalesco – Nem sempre um Carnavalesco precisa construir uma ponte entre passado, presente e futuro. Em alguns momentos, pode misturar tudo ou deixar tudo subjetivo. O que precisamos é contar bem uma história, que ela seja entendida por todos na Avenida. A liberdade poética de um enredo permite ao Carnavalesco sonhos e delírios. Volto a dizer que o Enredo é sobre os RITUAIS DE CURA, e não a cura num contexto geral ou sobre medicina. Só falaremos dos rituais! Se não tem ritual, não falaremos.
Sintonia – A precariedade nos serviços de saúde, o retrocesso no combate às doenças com campanhas anti-vacina e a ausência de profissionais nas regiões mais longínquas do País serão pontos a serem abordados dentro do Desfile da Rosas de Ouro?
Carnavalesco – Novamente falando, o Enredo é sobre os Rituais de Cura, então esses pontos abordados não se enquadram no nosso Enredo, pois eles estão ligados a medicina e política, portanto estão distantes do nosso Enredo.
Sintonia – A pandemia provocou mudanças significativas no ritmo de trabalho do Carnaval como um todo. Adiando, e até mesmo, nos fazendo imaginar como seria reunir tantas pessoas para prestigiar a rotina normal de um Desfile. Em seu ano inicial e já enfrentando mais este desafio, como a preparação e a materialização do seu trabalho vêm sendo realizada com a Equipe e Comunidade da Rosas de Ouro?
Carnavalesco – É um momento bastante diferente de tudo que vivemos até hoje. Mas a pesquisa e desenvolvimento do Enredo não foi influenciada em momento nenhum. Eu e a Rosas estivemos próximos todo este tempo. De uma maneira virtual, mas estávamos. Procuramos sempre nos adaptar a este momento. A Comunidade sempre esteve próxima também, através das redes sociais. A Escola ficou feliz com o Enredo e abraçou o samba escolhido da melhor maneira possível. Apesar do momento, posso dizer que a Rosas está feliz!
Agora estamos começando a parte prática do Carnaval, tirando ele do papel. Mas vamos sempre seguir todas as orientações e tomar todos os cuidados, protegendo e cuidando de toda a equipe. Desafios existem para serem vencidos, e mais uma vez venceremos um.
Sintonia – O Carnaval é das fontes de cultura com maior diversidade no Brasil, sendo também uma cultura popular bastante atacada, especialmente pela presença forte da junção das práticas religiosas, em especial de origem afro, e de elementos que são considerados ‘politicamente incorretos’. Seu olhar de Carnavalesco vai nos conduzir para um caminho de cura da alma na libertação desses dogmas e no reconhecimento que o Carnaval é um importante agente transformador do indivíduo e da sociedade?
Carnavalesco – O momento político que vivemos não é dos melhores, pelo contrário. O preconceito e ataque não é somente ao Carnaval, e sim a cultura, como um todo. Vemos um Brasil regredindo, empobrecendo culturalmente, socialmente e politicamente. O país caminha para trás.
Mas não terei um Enredo político. Falarei dos Rituais de Cura. Ele está muito mais para um Enredo histórico. Sou historiador, gosto de contar histórias e elas nos fazem pensar, questionar. Então esse questionamento fica para cada um de nós, depois que a Rosas de Ouro desfilar. Como o nosso samba diz: “Entenda que o samba também tem o dom de curar.” E se ele cura, ele transforma.
Sintonia – Como resumir o Enredo “Sanitatem”?
Carnavalesco – “SANITATEM” é um grito! um grito de alegria, de festa, de comemoração! Atravessar a avenida será uma forma de festejar estarmos vivos, acreditar na fé, na ciência e no homem. É um momento para agradecer a todos que estão lutando para que esse mal seja extinto e agradecer a todos, que de qualquer maneira lutam para que todos os males desapareçam, sejam eles físicos, mentais ou espirituais. “SANITATEM” é o ritual de cura da Rosas de Ouro! É o ritual de cura de todos os sambistas! É o nosso ritual!
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